Relações significativas
- Novembro 01, 2020
- por
- Patrícia Teixeira de Abreu
As noticias de ontem, sobre a necessidade de redução nos contactos sociais fizeram-me pensar numa conversa no Verão sobre relações significativas.
Esta pandemia com todas as coisas más e assustadoras que tem, tem também o mérito de nos fazer focar no essencial, e nunca foi tão importante como agora uma rede forte de relações significativas, que mesmo sem podermos abraçar, sabemos que estão lá para nós.
No Verão, na semana em que as miúdas foram de férias para fora jantei com uma amiga. A Luísa tem um coração especial, acolheu uma miúda da Guiné Bissau que veio há 4 anos para Portugal para uma operação de risco que era a última oportunidade para lhe salvar a vida. A miúda era para ficar 4 meses e está cá há 4 anos. Não pode voltar. A família não tem condições sanitárias na Guiné Bissau para a receber nem o país consegue assegurar o apoio de saúde que necessita. Com 56 anos, filhos crescidos e sozinha viu-se de repente com uma criança de 5 anos, indefesa, desprotegida e a precisar desesperadamente de uma mãe em Portugal. Não a podia abandonar. Sem ajudas ficou com a miúda, deu-lhe um lar. Passaram 4 anos e aos 60 tem uma filha de 9, com todos os desafios que isso implica.
A miúda foi de férias com uma amiga da Luísa e ela pôde finalmente descansar. As minhas filhas estavam de férias e nada melhor que aproveitarmos para para pormos a conversa em dia numa varanda top em frente ao rio. Aproveitámos aquele jantar sem o “oh mãe, oh mãe habitual” e falámos entre outras coisas do cansaço de educar na diferença.
A Luísa é psicóloga. E no meio da conversa explicava-me que era importantíssimo para ela a rede de relações significativas que tinha construído e falava-me de inteligência relacional. Eu adoro estes temas e ouvi atentamente.
Somos nós que construímos a nossa rede de suporte, que não é só feita de grandes amigos próximos ou família chegada. Fundamentalmente é feita de pessoas que nos fazem bem. Quando mais alargada e diversa for essa rede , mais nos enriquece e nos ajuda a crescer. Normalmente pessoas de grandes desafios têm uma rede de relações significativas grande. Achei curioso. Fiquei a processar. “ És mesmo psicóloga – disse-lhe eu – nunca tinha pensado nisso.”
Esta conversa fez-me pensar na sorte que tenho na minha rede de relações significativas que são as pessoas que estão na minha vida e que são a minha rede de segurança nos meus saltos em altura. Pensei na rede desta criança quando chegou a Portugal sozinha e sem os pais. Pensei na rede de relações significativas da Francisca que lhe dá tanta segurança. Pensei na inteligência relacional que é preciso desenvolver para lidar com a diferença, seja ela neurológica, racial, motora etc.
Às vezes temos mesmo de relativizar. Os pais biológicas desta criança dizem entre lágrimas que a saudade é o preço da saúde da filha. Esse é sem dúvida o maior acto de amor que se pode ter por um filho.
Esta semana,e de regresso ao confinamento que o nosso dever cívico impõe, vou fazer a terapia com a Francisca com abraços.Muitos.Imensos.Infinitos.
Obrigada Luísa, por fazeres parte da minha rede de relações significativas. É um privilégio ter pessoas à volta tão genuinamente inspiradoras!
De coração cheio.